sábado, 16 de julho de 2011

O encontro no largo Parte II


- Meu nome é Kate, e o seu?
- O meu nome é Sebastian.
- Ok Sebastian vou entrar.
Logo após Kate entrar ele ficou ali fora parado pensativo, sabia que algo tinha acontecido, não sabia o que era ainda, mas foi algo bom, ele sentiu aquela sensação de paz e de conforto, a mesma sensação que você tem quando sai do trabalho após um dia repleto de estress e finalmente chega em casa, então resolveu fumar mais um cigarro e mudar o foco dos seus pensamentos. Ao entrar logo reconheceu a musica que estava tocando, ele se sentia bem com isso naquele bar, poder reconhecer as musicas as mesmas que muitas vezes já embalaram algumas de suas noites solitárias em casa. Sem perder tempo foi logo procurando por Kate, que não era difícil de ser reconhecida, morena da pele bem clara, cabelos escuros na altura dos ombros e bem lisos, usava uma maquiagem leve e o belo detalhe dos óculos, estava usando uma saia mais ou menos até a altura dos joelhos e uma meia calça preta por baixo, na parte de cima usava uma blusinha e uma jaqueta jeans por cima, estava extremamente linda. Ao descer as escadas da entrada, o lado oposto do caminho que fizera no inicio, entrou no corredor que era decorado com mais desenhos psicodélicos, algo que misturava letras e paisagens de filmes antigos que foram readaptados a pouco tempo por algum diretor superestimado que ele não lembrava o nome, mais pessoas caçando, rindo se divertindo, observou mais mulheres interessantes e até trocou olhares com algumas delas, coisa rápida que é sempre bem vinda. Ao entrar na pista de dança logo viu Kate e suas amigas dançando completamente hipnotizadas pelas luzes e pela musica, tranasmission faz isso com as pessoas, o som grave do baixo e a voz agonizante do Ian Curtis misturados ao álcool, que naquele momento deveria estar transitando em grande quantidade em seus corpos. Ficou de longe assistindo, coisa que Sebastian sabe fazer muito bem, até o momento que Kate o viu e veio em sua direção com certo sorriso misterioso, algo perdido entre interesse e mistério.
- Sebastian vai dançar ou ficar ai a noite toda me secando?
- Não estou te secando, só estava observando você com carinho.
- Ahhahah, Entendo, entendo.
- Na verdade estou indo embora, mas antes tinha que me despedir de você e não queria atrapalha-la ali com suas amigas.
- Mas é cedo ainda, porque já vai?
- Não sei, cansado e um pouco atordoado.
- Entendo, vai ficar aqui até que dia?
- Ficarei mais dois dias e então volto embora.
- Eu sei que você está louco para me chamar para sair amanhã e que se depender de você vai enrolar um bom tempo, então para adiantar as coisas marque meu telefone e vamos fazer algo amanhã a tarde, quero ouvir você reclamar mais um pouco sobre tudo e todos.
- Presunçosa, mas vamos sair sim.
Sebastian ficou estupefato com a atitude de Kate, percebeu que ela tinha se interessado por ele, não sabia o porquê, pois tinham acabado de ter um dialogo um tanto quanto pesado e discordavam de todas as coisas, mas algo tinha brilhado ali entre eles. No outro dia logo após acordar ele ligou para Kate.
- Oi
- Oi
- Te acordei?
- Não, já estava acordada, quando abuso da bebida não consigo ter um sono bom, e ontem em especial cheguei em casa e fiquei viajando com algumas coisas, sabe quando você tenta dormir mas fica pensando e pensando, vira de um lado para o outro, coloca a mão embaixo do travesseiro, tira, e nada de sono?
- Sei sim, no que você ficou pensando? Em mim?
- Hahuauhahuh Nunca saberá.
- Então, pensei em irmos ali ao largo agora a tarde tomar algo, gosto daqueles bares com mesas de madeira que ficam para fora.
- Pode ser sim, vou me aprontar e logo apareço lá, você está onde?
- Em um hotel aqui próximo mesmo, quando estiver chegando me ligue.
- Ok, te dou um toque então.
- Beijo
- Beijo
Sebastian desligou o celular e foi tomar um banho, banho daqueles demorados e pensativos, lembrou de coisas, de situações e principalmente, lembrou de Kate.
Ele chegou primeiro, estava um dia bonito, sol e bem frio, ele estava bem arrumado e ela apareceu à altura, vestia um casaco de um tom verde bem escuro, quase preto, jeans por baixo e um cachecol branco enrolado em seu pescoço.
- Olá
- Olá
- Demorei?
- Nada alarmante, algo normal das mulheres.
- Não sou uma mulher normal.
- Percebi isso já.
- Você acha que percebe muitas coisas.
- Eu tento, às vezes acerto, outras não, assim vou tocando.
Kate acendeu um cigarro e olhou em direção as pombas que naquele momento estavam sentadas sobre um bebedouro que tem ali próximo.
- Gosto desse lugar, bonito, antigo, quantas pessoas já não passaram por aqui.
-Quantas estão passando agora, cada uma carregando sua historia, seus amores, suas dores, paixões e medos, aqui é um lugar onde as emoções se misturam porem cada uma em um universo singular.
- Exato, e cada qual consigo mesmo, pensando e vivendo, muitas vezes pensando demais e vivendo de menos, seu caso, outras vezes pensando de menos.
- Seria o seu caso?
- Huahuahuahu. Nem de perto.
- Qual é o seu caso então? Quem é Kate? Por enquanto só falamos sobre pessoas e comportamentos, agora quero falar sobre você.
- Não quero falar sobre mim.
Kate reagiu de maneira estranha a abordagem de sebastian, virou o rosto e ficou olhando para o infinito como se tivesse tentando expulsar alguma quimera que naquele momento estava dentro de sua mente.
- Sabe Sebastian, é tão difícil você falar sobre si mesmo, todos gostamos de tantas coisas, queremos tudo ao mesmo tempo em que não sabemos o que realmente queremos, ficamos felizes com algo que conquistamos hoje porem amanhã se torna algo descartável, sofremos se não temos algo mas quando temos não damos valor.
- Isso é ser humano Kate, achamos que sabemos quem somos, mas nossos espelhos mentem muito bem para nós, e ninguém fala como você realmente é, estamos preocupados demais com nossos prazeres e nossas vidas para falarmos sobre outros, e quando falamos apontamos os defeitos e falhas e nunca as qualidades.
- Esse auto conhecimento que eu queria ter, saber ao menos o que eu não quero, ter coragem de encarar o mundo após descobrir isso, hoje eu sou Maria, amanhã sou Madalena, já tive dias de Amélia e outras de Joana D’arc, mas raramente tive dias de Kate.
- Todos os dias são dias de Kate, você é única, só você viveu sua vida e só você sabe o que se passa em sua cabeça, ninguém pode ser feliz por você.
- O problema é esse, o que é ser feliz? Tantas coisas me fazem feliz, e cada dia que passa minha idéia sobre o que eu quero muda, tem dias que quero todos e tudo, tem dias que não quero nenhum, a tarde penso que a única coisa que me faria feliz é logo aquela que não tenho, mas sei que se tivesse em pouco tempo enjoaria.
- É o problema do desejo, desejamos demais, buscamos demais, treinados para consumir, e o pior, gostamos disso.
- Vou te falar o que chamou a minha atenção em você.
- Já sei, é porque sou bonito.
- Idiota. Estou falando sério.
- Eu também!
- Kate riu, aquele sorriso simples de uma piada qualquer contada por alguém que gostamos.
- Você parece livre. Solitariamente livre.
- Todo homem é livre, no entanto, deixa tornar-se escravo, parafraseando Sartre. Somos escravos de muitas coisas, escravos da imagem, escravos de nossos medos, de frustrações, de angustias. Somos covardes incapazes de lutar e acabamos cedendo, vamos com a corrente por comodismo, sempre sabemos que estamos indo com a corrente, apesar da grande maioria se enganar, e Kate, nada é pior do que se enganar.
É mais fácil aceitar a opinião unânime, crer naquilo que nos é dito desde que somos pequenos, aceitar os valores que a sociedade nos impõe, tudo isso somado a masturbação dos egos da massa, o maior feito do mundo não seria mérito algum se não existissem pessoas que não o fizeram, por isso buscamos a massa, nela encontramos valores pré-estabelecidos aos quais somente temos que nos adaptar.
Kate ficou em silencio um tempo, Sebastian percebera que tinha falado demais, descarregou sem piedade sua metralhadora verbal em cima de Kate, sem ao menos saber como estava o estado de espírito dela, resolveu mudar de assunto, musicas, filmes, lugares, coisas que gostavam de fazer, amores que vieram e foram, com a bebida o toque serio da conversa logo foi dando espaço para algo mais próximo a um certo encanto.
- Tenho que ir Sebastian, estamos aqui falando e falando a horas.
- Tem algum compromisso?
- Nenhum, só quero mudar de cenário, ir para casa e comer algo, tomar um banho.
- Acho que vou para o hotel também. Vai sair a noite?
- Até sairia, mas nada muito hard, quero algo mais suave, hoje não sou a mesma de ontem.
- Eterna mudança, sempre inconstante. Tem um certo charme nisso.
- Eu sou puro charme Sebastian. Me ligue mais tarde, tratamos algo.
Ligarei.
Ambos se despediram, Kate levantou-se, arrumou a roupa e o cachecol, deu mais um sorriso para Sebastian e foi descendo em direção a rua. Ele ficou mais um tempo sentado observando Kate sumir entre a multidão que ali passava. Levantou-se e foi pagar a conta, ao sair acendeu um cigarro e foi tomando seu caminho também, o interesse era evidente, tanto físico quanto subjetivamente, sorriu para si mesmo sabendo que o destino estava prestes a pregar uma peça nele, conhecia o tipo de Kate, mas mesmo assim não iria recuar, o tipo de Kate era a droga que ele mais gostava de usar.

continua...

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