sábado, 23 de maio de 2009

À minha dor, com carinho:



Devo ser um desses cães sarnentos abandonados por Deus, que esqueceram de onde vieram e não sabem para onde irão, obrigados a passar suas vidas perambulando pelas ruas mendigando um pouco de carinho e comida. Tenho eu esse fardo maldito a carregar, passando um dia após o outro na companhia da minha solidão que se mistura aos meus pensamentos melancólicos, aos meus sonhos esperançosos e as minhas decepções humanas. Sempre acordo tarde, rodeado por bitucas fedorentas de cigarros baratos, roupas sujas com vômitos da noite anterior e nenhuma lembrança que consiga arrancar-me um sorriso matinal. Sei que sou mais um mendigo hipócrita, que descobriu cedo a dor do amor e a realidade da ilusão, incapaz de encontrar paz ou aconchego em colo algum. Todas as vezes que tentei deixar de ser só acabei me machucando e machucando quem não merecia a dor, vagabundos como eu sim merecem a dor porque são capazes de suportá-la, os anjos não a merecem, os anjos devem ficar longe dos cães como eu, enquanto nós os canalhas melancólicos devem ficar longe de todos, para o bem comum de ambos. Por ironia do destino, não é amor que me falta e sim amor que me sobra, tenho tanto amor em mim que uma pequena porcentagem dele seria capaz de fazer sorrir aquele que já enrugou o rosto de tanto sofrer, o que me mata é esse amor todo incapaz de encontrar uma trajetória, um destino, um lar, e esse acumulado sufoca minha alma, me enlouquece, me destrói aos poucos enquanto sou obrigado a sorrir para sobreviver. Queria eu uma única vez voltar a encontrar um colo sincero para descansar minha carcaça cansada, deitar-me sem me preocupar com regras ou anseios, queria amar e ser amado, porque até um vagabundo como eu merece ser amado por alguém, nem que seja um amor de verão, carnaval ou conveniência Mas cada dia que se passa percebo que isso não é para mim, percebo que assim como existem pessoas que nascem sem olhos, sem braço, sem mãe, sem pai, sem dom da musica, eu nasci sem par, percebo que nasci para amar e não o contrário. Percebo eu que a única companhia que tenho/terei é minha solidão e melancolia. Até que a morte nos separe, até que a morte nos proporcione o descanso merecido dessa brincadeira malvada chamada vida.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Ao meu amor, com carinho:


Finalmente consigo digerir a idéia de nunca mais te tocar, te beijar, sentir seu cheiro, seu gosto, deslizar meus dedos sobre sua pele macia, branca, beijar lentamente seu pescoço até ele ficar avermelhado, observar de perto as pequenas sardas que habitam seu rosco delicado, ingênuo, fofo. Vejo que todas as brincadeiras intimas só terão vidas em minhas memórias noturnas, que seus lábios nunca mais irão se abrir para dizerem o quanto me ama, me deseja, ou simplesmente para suspirar com meus beijos apaixonados. Nossos planos ficarão todos no papel, na teoria, todos nossos pequenos sonhos morreram antes mesmo de nascerem, prematuros, sofreram de uma morte precoce, foram destruídos, esmagados em um único ato animal, uma decisão de tesão matou toda história de amor entre eu e você. É difícil viver sabendo que tudo se tornou passado, utópico, platônico, dói na minha alma ver seus olhos me desejando ao mesmo tempo que me mandam embora, saber que sonhas comigo ao mesmo tempo que deseja apagar-me, dói demais te ver em mãos que não te tratam da maneira como eu tratava, machuca-me saber que quando fecha seus olhos às vezes lembra-se de mim e um frio logo bate em sua barriga, uma nostalgia gostosa nasce ao mesmo tempo que tentas espantar a lembrança de todo mal que eu te fiz, mal esse que terei que pagar pelo resto da vida, viverei com o fantasma do erro de ter perdido a única pessoa que demonstrou amor por mim através de um simples olhar. E nossa quimera eterna será viver sabendo que ambos não seremos felizes em outros braços ao mesmo tempo que não poderemos ficar juntos novamente.